18.7.07

O pesadelo de Carter por Sérgio Ramos (Publico)

Nunca o tinha feito antes. Publicar algo que não seja meu neste blog.
Todavia, hoje partilho um trabalho jornalistico que me "incomoda" desde março.
Para mim é em torno dos sentimentos que se vive, nem que eles cheguem tarde demais...



Kevin Carter, Sudão, 1 de Março de 1993 (© CORBIS/Sygma)


"O abutre espera pacientemente o momento para atacar o corpo em agonia de uma criança sudanesa. O fotógrafo, também predador, espera um momento certo para o disparo que garanta o maior dramatismo, o maior impacto à imagem.
Esperam.
Esperam ambos.
No impasse, o fotógrafo desiste, capta a espera do outro e vai-se embora.
Esta fotografia valeu ao sul-africano Kevin Carter um prémio Pulitzer em 1994. Desde que foi publicada na capa do New York Times, transformou-se no seu maior pesadelo. Para onde quer que se voltasse soava a pergunta: “e depois, o que é que fizeste para ajudar a criança?”. Carter não fez nada e essa decisão acabou por lhe toldar a lucidez e levá-lo ao suicídio, no mesmo ano em que foi galardoado.
Kevin Carter começou a carreira como fotojornalista em 1984 no The Johannesburg Star. Retratou o apartheid a partir dos locais mais violentos e perigosos dos arredores da capital sul-africana. Desde a libertação de Mandela, em 1990, até à paz e democracia, em 1994, testemunhou a demência assassina que se instalou em bairros como o Soweto, Tokoza e Katlehong, a lado de outros três fotojornalistas, a saber Ken Oosterbroek, Greg Marinovich e João Silva, um grupo que ficou conhecido por “Bang Bang Club”.
John Carlin, jornalista inglês destacado pelo The Independent para cobrir o conflito sul-africano, traça no El Pais o percurso de Carter e explica como, nestes cenários, se perde a compaixão."


Kevin Carter

11 comentários:

Anónimo disse...

Caro Tiago: parabéns por referires este caso, que também li. Multiplicam-se ultimamente os concursos, como World Press Photo e outros, nos quais parece ganhar sempre a foto que exibe o expoente da pobreza e degradação humanas, como se não houvésse mais nada. Chegou-se ao cúmulo deste caso, pessoal e artístico, aonde o fotógrafo esperou pelo momento fatal sem sequer admitir entrar no seu "enquadramento" e alterar a situação, sem qualquer compaixão e identificação com aquela criança. Isto, para mim, é "alucinação estética" em demasia, causadora duma frieza inumana nunca sentida nos meios artísticos.

J.G.

Anónimo disse...

É sempre difícil encontrar algo para além da alucinação que procuramos. Mas arrependimento não mata,cura se ele for verdadeiro.
O relativismo, que tanto me ouves falar, o individualismo cegam quem não encherga mais além.
A história aconteceu, aprendamos com ela.
JAbreu

Anónimo disse...

Será q Kevin Carter poderia ter feito algo q mudasse a situação daquela criança no estado tão avançado de "desumanidade" em q se encontrava?
E as outras todas pelas quais passou em igual estado?
Será q poderia mesmo ter feito algo diferente?

Não sei mesmo!

Anónimo disse...

Não julgo ninguém, porque a situação já teve o desfecho. Resta, como se disse, aprender com ela. A imagem é a duma criança em sofrimento absoluto de inanidade, sózinha e indefesa perante um abutre pronto a atacar, estando a ser observados por divertimento estético por outra impassível criatura da mesma espécie da que está a falecer. Antes de se ser artista é-se homem, e no caminho aprende-se a dignidade e solidariedade. Não interessa "as outras", interessava aquela criança concreta, que não merecia um voltar de costas inconsequente e um registo para o comércio. Ou não? Já chegámos à soporização individual nesta avançada civilização, em passeio pelo Sudão para admirar vistas como estas?
Andam a dar fortunas a Comissões pelo Darfur, outro tanto em Live Aids, para quê? Para isto?
JG

Manel disse...

caro Tiago,
Um abraço.
Conhecia a foto e desconhecia a história que lhe está associada e que outras podemos associar.
Qualquer fenómeno ao ser observado tem sempre uma perturbação provocado pela presença do observador.

Anónimo disse...

Dificil se hace ver la crudeza del sufrimiento humano ajeno a nuestra realidad, sin embargo mas dificil no tornar las imágenes del sufrimiento en lo común, lo cotidiano. No se que pasaba por la cabeza de Kevin Carter mientras encuadraba, hacía foco y esperaba el momento oportuno para disparar...cómo nos posicionamos ante el dolor de los demás, cuales son los límites de la compasión y las obligaciones de la conciencia.Una imagen puede desencadenar rebeldía, agresividad o indiferencia. ¿y el espectador de esta o cualquier imagen del dolor? ¿nos conmueven, nos indignan o nos vuelven insensibles?.
Un abrazo grande Tiago

Anónimo disse...

Tiago,
Tu bem sabes q há pessoas q n olham a meios p atingir fins, mesmo que tenha de custar a vida de alguém...É das coisas mais tristes que já vi. Não entendo como não há lugar a sentimentos perante uma criança indefesa. Como se pode ser tão frio e calculista? Infelizmente muitos "Kevin Carter" nos rodeiam...Só me questiono inumeras vezes "Para onde caminhos com esta sociedade?"
Lili

MANHENTE disse...

Bom post! Bastante pertinente. Quantas vezes pensamos nisto quando tiramos uma fotografia?

É tão chocante o sofrimento limite da criança como o suicídio do fotógrafo. Distinguir um do outro é não perceber a razão profunda de ambos.

Um abraço,
Rui

Anónimo disse...

"SALADAS" Estou cinseramente tocado com a questao que aqui se levanta,-O que é moral e o que nao o é! continua,nao pares de me supreender *deste amigo * luis simoes,luxembourgo

Carol Bonando disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carol Bonando disse...

Eu amo este livro, li duas vezes. Me emociono sempre que falo dele.